plural

PLURAL: os textos de Juliana Petermann e Eni Celidonio

Silêncio
Juliana Petermann 
Professora universitária

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A sensação de voltar ao começo. De reiniciar sem ter parado. As águas de março chegam com ares de filme repetido de sessão da tarde. Um "de volta para o passado" triste e com características de filme de terror. Voltamos a fazer pão em casa e a pensar que talvez estocar alguma comida não seja uma má ideia. O que mudou neste ano? No que nos transformamos? Qual foi a casca que nos envolveu e que nos faz aguentar quase duas mil mortes por dia no nosso país? E como é que aguentamos? Viro a página do jornal. Desligo a televisão. Desconecto das redes sociais. Nada disso me desconecta da realidade. Portas fechadas e a segurança daqui dá de cara com a insegurança lá de fora. Num grande paradoxo, faço como se rezasse um terço: agradeço por estar em casa, sofro pelos acontecimentos do lado de fora, agradeço por estar em casa... E diante da página em branco me sinto vazia. Como é que a gente pode escrever sobre um tempo que não gostaríamos de estar passando? De onde vem inspiração diante de uma realidade tão dura?

TEMPOS ÁRIDOS

Muito da inspiração está lá fora. Enquanto estamos aqui dentro. Mas e será que ainda está lá fora? O hoje já não parece ser matéria-prima: a aridez do tempo nos arremessa contra o peito a estupidez de falas que vociferam que chega de frescura, de mimimi, que seguremos o choro. Penso em escrever sobre o contexto político, mas esse tempo, de tão duro, exige cuidado: nem todas as palavras estão livres. Lá fora encontramos de um lado dor e sofrimento de quem chora por quem morre, e do outro lado encontramos desprezo, desobrigação e deboche. O tempo é árido, infértil, não deixa nascer nada. Mas como é que, diante da falta de humanidade, a gente consegue manter a nossa? 

QUE NÃO NOS FALTE SENTIR

Enquanto eu penso no quanto é difícil escrever e ter inspiração diante de tanta dor, eu encontro saída na sensibilidade. Encontro saída ao me importar. E espero que nunca nos falte peito para sentir. Que a gente compreenda que não é pouco o que estamos passando. Que consigamos visualizar o tamanho da tragédia. Registrar na memória e aprender com os erros. Reconhecer nosso papel e nossa responsabilidade nisso tudo. O Brasil já perdeu um número de pessoas equivalente à população da cidade de Santa Maria. Imagina se desaparecêssemos do mapa. Fica difícil escrever neste momento. Em primeiro lugar, porque nenhum assunto tem a mesma relevância. Em segundo, porque talvez a gente esteja precisando mesmo sentir, dar uma pausa e fazer um pouco de silêncio.

Visitas indesejáveis
Eni Celidonio 
Professora universitária

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Sabe aquele dia que você acorda, vai na cozinha passar um café, e vê um vulto pequenininho correr para sua sala? Você pensa: ainda não acordei direito... E de repente, outro vulto menor ainda passa por você, para, dá uma encarada e segue o caminho como se nada tivesse acontecido. Você fica gelada e pensa: Meu Deus! É rato!

Isso aconteceu comigo em Bagé. A casa ficava ao lado de um depósito do Supermercados Vigil. E eles faziam aglomeração à noite, no teto da casa. Dava para ouvir o barulhinho quando íamos dormir. Um horror!

Em Campo Grande, ao lado da nossa casa era um terreno baldio, a casa ficava no fim da rua, e aparecia de tudo! Gato do mato, aranha, lagartixa, não dei quantos sapos nadando na piscina e um que não se pode esquecer nunca: o calango. Gente! Era um lagarto enorme, parecia um filhote de jacaré. Entrava pela frente, porque o muro era baixo, com grades altas, e ele, não sei como, passava pelas grades. Era da cor da grama. Um dia vi a grama se mexer e falei pro Celso que tinha um bicho na grama passeando, e ele teve a empáfia de me dizer que eu estava sonhando, porque ele não ouvira o interfone tocar. Mas lá estava ele, tomando o sol da manhã.

Aqui em Santa Maria, houve uma leva de pombos que fez o condomínio resolver colocar rede em todo o prédio, para evitar que eles sujassem as floreiras. Realmente, foi o que aconteceu. Mas não sei como, um morcego passou pela rede e ficou tranquilo, pendurado, pensando na subida do dólar... Gente, como a criatura passou eu não sei, mas com um calor terrível a janela se manteve fechada, até Santo Eduardo, o nosso zelador, resolvesse o caso.

Uma colega da UFSM acordou um belo dia e resolveu terminar um artigo para uma revista, e viu que acima do computador, bem acima do monitor, algo se mexia (lembrem-se de que o monitor há um tempo tinha uns dez palmos de profundidade). Ela, entre assustada e curiosa, resolveu conversar com a coisa, mas a simpatia não era recíproca, e então ela disse que viu uma cabeça se levantar e ela se deu conta: uma cobra! Uma cobra dentro de casa, em plena cidade! E eu que pensava que morcego era o máximo do susto!

Agora, meu dentista foi descansar numa casa que tem na praia e deixou uma porta da casa entreaberta para que seu gato saísse à noite para passear. A casa é toda gradeada, monitorada, nada escapa. Pois bem, ficou um final de semana de papo pro ar, voltou e a cozinha estava em petição de miséria. Frutas comidas e jogadas pelo chão, louças quebradas, potes revirados, um verdadeiro caos! O primeiro suspeito, é claro, foi o gato. Só pode! Ficou furioso por ser abandonado por três dias e resolveu se vingar. Olha daqui procura dali, e lá estava ela, refestelada na sala, bem alimentada, dormindo o sono dos justos: uma raposa...

E o Adede y Castro postando, no Facebook, um gambá inofensivo na varanda da sua casa. Eu hein...

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